quarta-feira, 15 de agosto de 2012

O direito feminino ao voto comemora 80 anos

Mais que números, representar a maioria do eleitorado brasileiro significa hoje a consolidação de um direito “recente” para as mulheres do país. A correção do atraso, de mais de um século em relação à primeira legislação eleitoral, só chegou em 1932, através do Código Eleitoral Provisório, e ainda assim incompleta.


Naquele momento apenas mulheres casadas –autorizadas pelo marido -, ou viúvas e solteiras - com renda própria - podiam exercer a plena cidadania. Estas restrições só foram eliminadas inteiramente pela legislação de 1946, quando o voto feminino tornou-se obrigatório.

No Brasil do início do século XX, permitir à mulher o direito de participação direta na política local espalhava temor. Era tido como atestar a dissolução da família brasileira. Tomada na ‘Era Vargas’, a decisão foi controversa.

“A efetivação da conquista ao voto se dá em uma base de preconceitos contra as prováveis eleitoras mas, embora se possa considerar que àquela altura a sociedade brasileira era conservadora a ponto de negar à mulher o direito do voto, ou simplesmente ignorá-la enquanto uma cidadã com direitos, não se pode negar que as mudanças já vinham acontecendo”, afirma a professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Pará (UFPA) Maria Luzia Álvares.

“Não se pode dizer, entretanto, que a participação política das mulheres só inicia a partir deste evento (instituição do Código Eleitoral de 1932). Na verdade, a mulher brasileira já estava inserida no contexto político desde o século XIX, com o advento da democracia moderna, ao pleitear igualdade política. Mas foi necessário entrar na luta contra a desigualdade e conquistar direitos e espaços. Nada nos foi dado, não éramos incluídas devido ao modelo de representação feminina que pesava, e ainda pesa, sobre nós, o de mantenedoras do lar”.

As primeiras discussões sobre o voto feminino ocorreram na época da elaboração da Constituição brasileira de 1891, a primeira da República. No fim, o texto acabou por não prever o direito, sem contudo o proibir. “Na realidade, a legislação não contemplava o direito ao voto assim como também nunca o proibiu. O fato é que inicialmente o voto estava intimamente ligado a rendimento e as mulheres da época, em sua maioria, eram dependentes dos maridos e, assim, o direito foi sendo postergado”, destaca a juíza da 29ª zona eleitoral de Belém, Angela Tuma.

“Efetivamente, o direito ao voto feminino vem em 1946. Em 32, há a previsão na legislação, mas com o fechamento do Congresso (golpe do Estado Novo) em 1937 há um retrocesso no processo democrático que atinge a sociedade como um todo e prejudica a participação feminina”, informa.

MUNDO
No mundo, a garantia ao sufrágio feminino ocorreu pela primeira vez na Nova Zelândia, em 1893. Ainda assim, para a juíza, não se pode considerar que a legislação brasileira seja atrasada. “Quanto à questão eleitoral, o Brasil sempre esteve na vanguarda. A legislação estrangeira mostra que vivenciamos esta realidade dantes que França, Portugal e Suíça, países que somente após 1940 tornaram real o direito da mulher de também participar da escolha dos mandatários de suas respectivas nações”, explica.

Segundo a pesquisadora da UFPA, Maria Luzia, que defendeu uma dissertação de mestrado acerca da relação entre as mulheres paraenses e o voto feminino, no Pará, as primeiras discussões acerca do acesso feminino às eleições remontam ao senador Justo Chermont. O estudo evidencia a apresentação de um projeto, de autoria do próprio senador, que já em 1919 propunha o direito de voto a todas mulheres brasileiras. Antes disso, ainda sem perspectiva de direito a voto, as paraenses não deixavam de participar da política local, inclusive com mobilizações coletivas.

“No conflito entre as facções de Lauro Sodré e Antônio Lemos pelo poder político estadual, em 1912, foram criadas duas ligas de mulheres para sustentar as distinções entre esses líderes. Eram formadas por esposas, filhas, irmãs, amantes, parentas desses políticos e faziam manifestações de rua favoráveis a eles”, relembra.

“Tempos depois, em 1931, foi criado o Núcleo Paraense pelo Progresso Feminino, integrado à Federação Brasileira pelo Progresso Feminino. Muitas sufragistas dessa época foram criticadas pela imprensa, os escritos dos jornais dessa época são terríveis o que demonstra que a luta não fora pacífica”.
(Diário do Pará)

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